Como não há notícias, como o Daesh não tem sido muito eficaz nas últimas semanas na Europa e como a política doméstica é uma porcaria execrável sem qualquer relevância, a primeira capa do DN de hoje era "A Musa de Manoel de Oliveira faz televisão", ou similar. A notícia, em cacha, tinha citação da própria como nas revistas cor-de-rosa: «Dizem que fazer Televisão é prostituição, sendo que fazer Cinema é o Amor; não acho nada !». Depois é ainda referido o nome da série em que a actriz aparecerá, A Terapia ou Terapias - não sei bem, qualquer coisa que também poderia ser o nome de um lupanar com salão de massagens, à Duque de Loulé.
Enfim Leonor Silveira, a ex-musa de Oliveira ou a musa do ex-Oliveira, precisa de viver, comer e pagar as contas - essa é a verdade. Fosse Oliveira ainda vivo, com para aí 125 anos, e estivesse a fazer filmes financiados pelo Erário Público, Leonor continuaria a ser a Musa de Manoel - desprezando do alto do Cinema de Autor a mui-piolhosa indústria das produções nacionais de televisão para as grandes massas gordurosas e desgrenhadas de residentes em sofás.
Assim como Manoel foi prosaicamente para o lixo, também a soberba e o elitismo de Leonor seguiram o mesmo caminho, dando lugar à humildade simpática que é mais eficiente na captura de verbas.
Como sou estúpido, mau e invejoso tudo isto me parece (erradamente) uma daquelas situações em que 'alguém' inventa a produção de uma séria feita à medida de Leonor para que a criatura possa viver. Como aqueles concursos públicos internacionais e anónimos que parecem mesmo feitos à medida deste arquitecto, daquele urbanista ou daqueloutro paisagista - e onde no fim eles ganham mesmo, contra as expectativas mais razoáveis.
Tais foram a amargura e o imobilismo mais feios e escuros veiculados pela maior parte dos filmes de Oliveira, que julgo até serem falsos os bicos-de-lacre dentro da gaiola, tendo a produção optado pelo uso intenso da bruitage. O Plano mostra-se e fica, fica, fica, fica.