Se alguém tivesse dúvidas acerca do ‘porquê’
ou necessidade de um golpe de estado na Turquia elas teriam sido dissipadas nos
últimos dias: desde que a tentativa foi frustrada e que Erdogan recuperou o seu
escritoriozinho com o seu telefone, “já foram presas mais de 13.000 pessoas”; e
em apenas 24 horas “já havia cerca de 6.000 detenções, sendo que metade seriam
juízes (!)”. Tendo em conta as investigações que em 2013 foram levadas a cabo
na Turquia visando a corrupção do partido no poder e a
cleptomania pessoal do presidente, a detenção de mais de 3.000 juízes torna-se facílima
de explicar. A súbita vontade de recuperação da pena capital como ferramenta de
dissuasão e vingança também é eloquente; junta-se desse modo a tempo às preparadas
“pequenas alterações” à Constituição Turca – aquelas que dilatarão de forma
absurda os poderes presidenciais e que lhe permitirão a permanência no cargo
indefinidamente, sem prazos, sem explicações, sem oposição. Juntemos a isto o
encerramento em marcha de jornais e televisões críticas do regime, assim como a
perseguição a jornalistas, e o fim da liberdade de imprensa será uma realidade gritante.
O fecho ou censura aos ‘twitters’ e o recrudescimento do islamismo fanático e
retrógrado são a cereja no bolo turco - presente hoje em dia em qualquer boa
edição do “Manual do Ditador” (DIY Dictat) disponível nos escaparates russos,
venezuelanos, chineses, sauditas, líbios etc.
Ao recordarmos a meteórica passagem que Hitler
fez de Chanceler da República Federal para Fuhrer ou as atmosferas meigas e humanistas
vividas nos países acima mencionados, gastamos energia em excesso e chafurdamos
inutilmente na Ciência Política: para encontrar um paralelo de “Ascensão e
Rapina” em pequena escala mas suficientemente recente para poder ser estudado
em laboratório (como o Bacilo do Tifo) basta pensarmos domesticamente em Sócrates.
José Sócrates que depois de ser PM duas vezes seguidas, esperava (antes da
crise…) vir a ser eleito PR – cumprindo o seu projecto pessoal de Poder e Glória
apoteoticamente delirante. O seu percurso de governo e golpismo é
recheado de episódios para todos os gostos, desde a patusca questão do
silenciamento administrativo do professor Charrua até à gravíssima mordaça
imposta ao Correio da Manhã por meio de uma juízazeca cúmplice e de doutorecos
serventuários. Deixou-se tentar pelo
luxo e cercar por generosíssimos amigos, cujos bolsos abarrotavam misteriosamente
de milhões. Enquanto governante fez lei facilitadora
do regresso/ingresso de capitais de
origens mais ou menos pardacentas apenas sancionado com coimas irrisórias. No
meio ficaram os aterros sanitários, o Freeport, a ameaça a jornalistas, a tentativa (bem
sucedida) de neutralizar a TVi, a promiscuidade na venda da PT, o
ajuste directo de obras públicas a pretexto “de maior flexibilidade”, o Heron
Castillo, o apartamento em Paris, os ténis Prada.
Erdogan é porém outro tipo de animal:
lidera o 2º maior exército da NATO e um país enorme que já foi Império; rouba à
grande e castiga à grande – mandando matar e torturar conforme lhe apetece. E tem
em conclusão (para si) um “novo palácio presidencial” rico de grandiosidade
pirosa.
À ferocidade de Sócrates assentava bem o
ensaio para um Culto da Personalidade - que já se adivinhava como corolário
natural de tudo em que se metia. Mas os seus devaneios arquitectónicos privados
ficaram-se pelo anexo abarracado no quarteirão da Abade Faria (nº33).
Banditismo Otomano ou banditismo Luso: uma
questão de tamanho.